2940/2020
Data da Disponibilização: Terça-feira, 24 de Março de 2020
Tribunal Regional do Trabalho da 3ª Região
3713
sem diagnóstico definido, havendo colheita de sangue no mesmo
Diante desse cenário, são inócuas as declarações do Sr. Astolfo, as
dia. Comprovam, ainda, a piora rápida do seu estado clínico, com
quais também tentam confirmar que a área de repasse e expedição
falecimento no dia 15/05/2016, constando na certidão de óbito como
é limpa pela ré e por prestadoras de serviços, que o uso de EPI’s é
provável causa da morte “insuficiência respiratória aguda,
obrigatório nas dependências da reclamada e que não tem
pneumonia atípica, asma”. Comprovam, por fim, que a amostra de
conhecimento de outros casos de hantavirose na empresa. A
sangue colhida do obreiro antes de sua morte foi devidamente
referida testemunha esclareceu que não acompanhou a diligência
analisada, com definição final do diagnóstico de hantavirose no dia
realizada pela equipe de zoonoses e que não sabe detalhes sobre o
25/05/2016, sendo que a inspeção do setor de Vigilância Ambiental
ocorrido com o Sr. Maylon, motivo pela qual seu depoimento em
estabeleceu as dependências da reclamada como local provável de
nada contribuiu para dirimir a controvérsia dos autos.
tal infecção.
Pelo exposto, acompanhando o laudo médico pericial oficial,
A esta altura, é importante transcrever as constatações dos agentes
reconheço o nexo causal entre as atividades laborais exercidas pelo
do setor de Vigilância Ambiental quando foram ao local de trabalho
Sr. Maylon Silveira Costa em benefício da reclamada e a doença
do de cujus, in verbis: “Conversando com seu primo que também
que ocasionou sua morte.
trabalha no local ele relatou um depósito onde eles buscavam
Sendo a reclamante a mãe do de cujus (f. 39 - ID. 1cd1aa9),
alguns materiais para o trabalho de campo. O local que é um
inequívoca a prova do dano por ela sofrido e, diante do resultado
estoque de materiais do setor de manutenção foi visitado então pelo
lesivo (morte), enquadra-se o caso concreto como gerador do direito
agente Carlos que relatou um local abafado com várias salas e com
à indenização por dano moral, por extrapolar o cenário típico do
um único acesso por um portão de tela. Local apresentou muita falta
direito material, razão pela qual julgo procedente o pedido e
de organização, com papelão ruído e presença de fezes de roedor
condeno a parte reclamada no pagamento de indenização por dano
silvestre, justamente onde foi relatado pelo primo que ele pode ter
moral.
buscado as telas para reparo” (grifo meu; f. 297 - ID. d154de2 - Pág.
Para fixação do montante indenizatório a título de dano moral, deve
5).
ser considerada a extensão do dano (CLT, art. 223-G, caput e
Ressalta-se que a ré, ao se manifestar acerca do relatório do
incisos; CC, art. 944) e os limites do pedido. Além disso, são
Departamento de Vigilância em Saúde/Vigilância Ambiental, não
importantes a equanimidade na sua aplicação, além da finalidade
impugnou o fato ali relatado de que, no depósito de materiais da
pedagógico-punitiva da medida e da capacidade econômica da
empresa, havia fezes de roedores silvestres, confirmando que o de
reclamada. Note-se que, por violação ao direito fundamental à
cujus frequentava o local, apesar de alegar que era
indenização, é inconstitucional a tarifação indenizatória prevista no
esporadicamente, o que sequer impede que o Sr. Maylon tenha se
art. 223-G, §1º, da CLT, na esteira da jurisprudência do STF (RE
infectado com o hantavírus em alguma dessas incursões. Ademais,
315.297).
a reclamada alega período de incubação de 3 a 5 anos indicando
O sistema de tarifamento, como pretende o parágrafo 1º do art. 223-
doença diversa da que vitimou o Sr. Maylon, qual seja hanseníase,
G da CLT, já foi considerado inconstitucional em outras
e não hantavirose, o que também desmerece a impugnação
oportunidades, quer pelo Superior Tribunal de Justiça (Súmula 281),
apresentada.
quer pelo Supremo Tribunal Federal (RE 396.386-44/SP, Rel. Min
Somado a isso, a defesa, por si, adota tese genérica de
Carlos Velloso; RE 447.484/SP, Rel. Min. Cezar peluso; RE
cumprimento das obrigações trabalhistas pela empresa, mas sem
240.450/RJ, Rel. Min. Joaquim Barbosa; e AI 496.406/SP, Rel. Min.
negar os fatos alegados na inicial, efetivamente. Inclusive, a
Celso de Mello e ADPF 130, na qual se analisou a recepção ou não
contestação contém menção a requerimento de benefício
da Lei de Imprensa).
previdenciário, custeio da família, pagamento de valores
Diante disso e, considerando que o juiz de primeira instância pode e
equivalentes aos salários, concessão de plano de saúde e vale
deve reconhecer, incidenter tantum, a inconstitucionalidade de uma
alimentação à Sra. Ana Paula e seus descendentes, situações que
norma, reputo inaplicável o parágrafo 1º do art. 223-G da CLT,
não têm qualquer relação com a presente demanda. De forma
devendo o arbitramento se harmonizar ao postulado constitucional,
específica e concreta, a ré limita-se a afirmar a inocorrência de
o qual, por certo, não insculpe qualquer critério ou tabelamento do
outros casos de hantavirose na reclamada e a realização de
montante reparatório.
controle de pragas - que somente comprova em relação ao no de
Nesta quadra, sopesados os elementos existentes nos autos, a
2018 (f. 193/252 - ID. 375852c a ID. e58ba33) - alegações que, ao
gravidade do dano e a culpa da reclamada, entende esse Juízo que
final, não confrontam a tese da inicial.
o valor de R$ 60.000,00 é suficiente para compensar a reclamante
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